Um século de luta
O segundo século foi dos mais difíceis. A Igreja, apenas nascente, encontrou a tremenda resistência do Império romano, sobrecarregada do combate dos intelectuais pagãos. Estes ou a desprezavam (Tácito chamou-a de “detestável superstição”) ou a atacavam (Celso, negando o Messias, procurava destruir os fundamentos do Cristianismo), ou a afastavam, valorizando a filosofia pagã (Marco Aurélio) e dando-lhe feição religiosa (neoplatonismo).
A reação
Os cristãos eram tão dispostos a morrer como a defender sua fé. Com os primeiros ataques, surgiram as primeiras defesas. E de maneira diferente, porque os políticos não encontravam resistência quando investiam à espada, mas os intelectuais iriam sucumbir aos golpes tremendos das armas invencíveis da verdade.
Os apologistas refutam acusações e revelam a beleza e a benemerência da doutrina de Cristo. Falam aos imperadores e aos filósofos, condenando nuns os processos de barbaria, noutros os erros e sofismas. Este combate intelectual não é menos belo do que a resistência ao ferro e ao fogo. Nele toma parte um grupo de cristãos ilustres, que honrariam qualquer literatura.
De alguns, como Quadrato, conservaram-se apenas fragmentos.
Porque não prestavam culto aos ídolos, eram os cristãos acusados de ateísmo; Aristides demonstra que eles é que fazem uma ideia justa da Divindade, enquanto o culto pagão é falso e imoral.
Contra a filosofia pagã lança Taciano os seus ataques, sem nela ver algo de bom, o que lhe valeu o titulo de “fundador da apologética virulenta”.
Já Atenágoras tomou a justa atitude de “expor diretamente a verdade a todos os que desejam conhecê-la e salvar-se”.
Justino, filósofo, em duas Apologias combate as calúnias assacadas aos cristãos (ateísmo, desonestidade e crueldade) e nos deixa preciosas informações sobre o culto católico.
Minúcio Félix, escrevendo com pureza e elegância, para atrair os espíritos mais cultos de Roma, fez do seu Otávio a “pérola da literatura apologética” (Renan).
A maior figura deste século é Santo Irineu, Bispo de Lião, tanto pelo seu tratado Contra as Heresias como pela atuação na Igreja.
Nova fase
O século terceiro apresenta outras condições à Igreja: as perseguições, embora violentas, são antes locais que gerais; longos períodos de paz favorecem aos estudos; mas também enfraquecem o espírito cristão; aparecem as crises internas, com as controvérsias, as heresias e os cismas, que, no entanto, dão lugar ao aprofundamento das verdades dogmáticas. É o século dos grandes apologistas e controversistas.
Escola de Alexandria
A escola catequética de Alexandria toma grande impulso com Clemente. Colocada
entre o orgulho da filosofia grega e a loucura gnóstica, firma-se em três pontos: a apologia do Cristo contra o paganismo, a exposição da vida cristã e o conhecimento profundo da sua doutrina.
Sua maior figura foi Orígenes (185-255). Apologista, exegeta, controversista, místico, professor, é o homem mais douto de seu século, e exerce uma influência enorme e benéfica, sobretudo com a sua interpretação da Bíblia, que corrigia o grosseiro apego à letra. Cometeu contudo alguns erros, que foram depois condenados pela Igreja.
Os africanos
As florescentes cristandades da África dão quatro escritores: Arnóbio, que passa de adversário a apologista do Cristianismo; Lactâncio, o Cícero cristão, o historiador do Fim trágico dos perseguidores, o grande São Cipriano, Bispo de Cartago, onde desenvolveu um intenso trabalho pastoral, ao lado da admirável atividade intelectual ; e Tertuliano, o mais notável de todos os apologistas.
Convertido aos 30 anos, advogado, culto, defende com vigor o direito dos cristãos. É um argumentador lógico, que abala, quando não convence o adversário. Sua Apologética é a mais cabal das apologias e a mais célebre de suas numerosas obras. Eleva-se frequentemente a uma arrebatadora eloquência. Era de um temperamento lutador, mas apaixonado e orgulhoso. O apego às próprias ideias e a sua tendência ao rigorismo levaram-no à heresia montanista, em franca rebelião contra a Igreja, pois se convencera de que os cristãos espirituais (como ele) não dependiam da autoridade dos homens, mas diretamente do Espírito Santo.
Mons. Álvaro Negromonte,
Vitória sobre o erro, Livro História da Igreja